Varella diz não ter opinião formada sobre o aborto neste caso específico.
 "Na microcefalia, o diagnóstico definitivo é feito em geral próximo ao 3º trimestre.
 Você pega um feto aos sete meses e ele está quase nascendo", diz.
"Mas é lógico que eu respeito (qualquer decisão)."
"O importante é dar liberdade aos que pensam diferente", afirma o médico.
 "Essa é a questão fundamental do aborto."
Varella então levanta a pergunta: se a doação de órgãos em caso de inatividade cerebral
 tem aceitação popular, por que a retirada de um feto igualmente sem atividade cerebral
 é criticada?
Ele dá o exemplo de uma menina que sofre um acidente de moto e tem morte cerebral.
 "Ela pode, por lei, ter fígado, coração e rins retirados para doação, porque seu sistema
 nervoso central não está mais funcionando. O sistema nervoso central é o que
determina a vida. Mas até o 3º trimestre de gravidez, não há nenhuma
possibilidade de arranjo do sistema nervoso que se possa qualificar como atividade
cerebral em qualquer nível, a não ser neurônios tentando se conectar."
Drauzio continua: "Muitos consideram que a vida humana começa no instante da fecundação.
Mas, por esse raciocínio, a então vida começa antes, porque o espermatozoide
 é vivo e o óvulo também."
Religiosos e políticos
O médico faz críticas duras a quem argumenta contra o aborto a partir de princípios
 religiosos.
"O poder das igrejas católicas e evangélicas é absurdo", diz. "Mas não está certo a
maioria impor sua vontade. Respeitar opiniões das minorias é parte da democracia.
Tem que respeitar os outros, o modo dos outros de ver a vida."
À reportagem, Varella diz que discorda dos que culpam exclusivamente o governo
pela epidemia.
"O estado brasileiro falha em muitos níveis. Mas não dá pra colocar a culpa toda no Estado,
 essa é uma visão muito passiva. Larga-se o pneu com água armazenada, deixa-se a água
 acumular na calha... Esta culpa é compartilhada, a sociedade tem uma fração importante
 nessa luta."